Introdução
Registro, documentação ou necessidade de expressão, sacra ou profana, o fato é que a incisão ou gravado sobre superfícies rijas está presente desde que se conhece a história do homem. É de se supor que o esforço de apropriação e revelação de seu universo, milhares de anos antes da invenção do papel e da imprensa, tenha levado o homem a uma forma de registro. Possivelmente esta intenção aliada ao gesto de gravar impregnou de características específicas aquilo que iria estruturar uma "linguagem" bem distinta da do desenho, da pintura, da escultura, da fotografia e do cinema.
A troca, a comunicação e a divulgação no momento em que o homem se organiza socialmente, e especificamente com o advento dos primeiros núcleos urbanos, criaram a necessidade de encontrar um meio de multiplicação não só de texto como também de imagens. As implicações culturais e sociais que daí advieram são indiscutíveis.
A multiplicação de um original - a partir de uma matriz geradora veio romper a tradição valorativa da peça única, provocando uma renovação que iria afetar, inclusive o conceito e as avaliações estéticas. O valor de uma obra que aumenta ou diminui pelo fato de estar limitada a um possuidor privilegiado é quando muito, posta em questão. Esse valor na obra de multiplicação aumenta na medida do seu desdobramento, uma vez que patrocina a possibilidade de um convívio sem barreiras geográficas, sociais e culturais, com imagens, conceitos permanentemente transformadores da realidade. Assim a gravura vem expressar os anseios dos homens, sociais e culturalmente distanciados e diferenciados, consignados deste modo o seu alto sentido democrático.
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Gilberto Salvador
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A0045
Gilberto Orcioli Salvador (São Paulo SP 1946). Pintor, desenhista, gravador, arquiteto, professor. Forma-se em arquitetura em 1969 pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAU/USP, onde mais tarde atua como professor. Paralelamente aos estudos universitários, dedica-se à pintura e ao desenho. Expõe individualmente, pela primeira vez em 1965, na Galeria de Arte do Teatro de Arena em São Paulo. É premiado com a medalha de ouro no Salão de Arte Contemporânea, Campinas, em 1967, e, nas edições de 1969 e 1970, com o prêmio aquisição. Participa de várias edições da Bienal Internacional de São Paulo, e entre suas principais mostras individuais destacam-se duas exposições no Masp, em 1985 e 1995. Em 1999, a escultura Vôo de Xangô é instalada na Estação Jardim São Paulo da Companhia do Metropolitano de São Paulo - Metrô. Sua obra se caracteriza pela oposição entre gestual e o traço rígido, entre as formas orgânicas e inorgânicas, entre o movimento e o estático. Nelas, as formas vivas, homens, flores e animais dialogam com figuras geométricas. O crítico de arte Jacob Klintowitz publica dois livros sobre o trabalho do artista, História Natural do Homem Segundo Gilberto Salvador, de 1985, e Gilberto Salvador O Reino Interior, de 2001.
Nascimento
1946 - São Paulo SP - 16 de dezembro
Cronologia
Pintor, desenhista, gravador, arquiteto e professor
s.d./1980 - São Paulo SP - Leciona na FAU/USP
s.d. - São Paulo SP - Preside a Fundação Gilberto Salvador
1969 - Forma-se em arquitetura pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAU/USP
1985 - Publicaçao do livro História natural do homem segundo Gilberto Salvador: 1964-1984, de Jacob Klintowitz
2001 - Publicação do livro Gilberto Salvador: o reino interior, de Jacob Klintowitz
2009 - Publicação do livro Gênesis
Críticas
'Quando inicia sua carreira, em 1964, Gilberto Salvador realiza uma pintura que tende para a síntese formal e denota preocupações sociais. No ano seguinte sua pintura torna-se expressionista e o artista aprofunda sua reflexão no sentido político. Declara então que sente a pintura como elemento de modificação da realidade. Nos anos seguintes, elementos da pop art aparecem em seus trabalhos. Quando, em 1969, ingressa na Universidade, produz objetos com chapas de aço inoxidável e utiliza o computador para gerar imagens, em que o elemento orgânico e o inorgânico mantêm um diálogo particular, sob a égide de um formalismo cada vez mais rigoroso. Em 1976 passa a interessar-se pelo registro sequencial de animais em movimento e pela seriação de elementos da paisagem. Em seguida trabalha com a iconografia indígena e com figura do leão, tomada como símbolo do poder. Depois surgem as aves de rapina e sua pintura alça um poderoso e ao mesmo tempo poético vôo em direção aos altiplanos da cor. Surgem os vôos soturnos, os vôos verdes, os vôos reflexos, os sons roxos, os mergulhos coloridos, os gestos azuis. A pintura gestual torna-se uma das características mais marcantes do artista e a cor assume um papel decisivo em seu discurso plástico'.
Júlio Louzada
LOUZADA, Júlio. Artes plásticas: seu mercado, seus leilões. São Paulo: J. Louzada, 1984-.
'A arte de Gilberto Salvador é feita de oposições. É o diálogo entre elementos aparentemente opostos e irreconciliáveis que confere ao seu trabalho a permanente sensação de expectativa e emoção. Neste caso, a pintura é feita a partir de tênues ligações entre situações contraditórias compatibilizadas num detalhado estudo visual. O artista inventaria a imagem do animal, a imagem da vida selvagem, a herança indígena, o confronto entre o orgânico e o inorgânico. A sua palheta tem dois movimentos distintos, pois é fria e calculista na organização de delicados fundos e geometrias rígidas, e quente e lírica no gestual e nas interferências que cria para as estruturas que ele mesmo inventou. O artista movimenta-se entre estes pólos e constrói o seu trabalho neste fio de lâmina, oscilando entre naturezas diferentes. Gilberto Salvador ama o perigo e a aventura da criação visual, e a sua pintura ilumina-se nas descobertas de inesperadas relações formais'.
Jacob Klintowitz
KLINTOWITZ, Jacob. O ofício da arte: a pintura. São Paulo, SESC, 1987.
'Arquiteto, professor universitário, conferencista, Gilberto Salvador destacou-se por seu espírito inquieto, pela inovação formal e por uma singular ousadia ao colocar as questões estéticas embasadas num sólido conhecimento das questões sociais e planetárias. Desta maneira, muito jovem, realizou uma série de trabalhos utilizando ícones da sociedade de massa, oriundos das histórias em quadrinhos e da comunicação comercial, no espírito da Pop Art, com aparência Pop Art, mas de manifesto caráter crítico, que causou comoção por seu conteúdo político e formal.
Depois deste início impactante, o artista avançou nas áreas da pintura e da gravura, realizando uma profunda reflexão sobre as questões ambientais, sendo um dos pioneiros brasileiros na busca da consciência planetária e no entendimento do nosso mundo como um ser vivo e de habitantes interdependentes'.
Jacob Klintowitz
KLINTOWITZ, Jacob. Gilberto Salvador: o reino interior. São Paulo: Fundação Cultural Gilberto Salvador, 2001.